A fascinante profusão de usos da soja: Insumos para a indústria
Por Décio Luiz Gazzoni, pesquisador da Embrapa Soja e membro fundador do Comitê Estratégico Soja Brasil e do Conselho Científico Agro Sustentável
A Cédula de Produto Rural (R) é um dos principais títulos utilizados para o financiamento do agronegócio brasileiro. Criada nos anos 1990, a partir da publicação da lei 8.929/1994, a R enquadrou-se em um contexto de estímulo ao financiamento privado da cadeia produtiva do agronegócio. Recentes mudanças legislativas – sobretudo as Leis do Agro (leis 13.986/2020 e 14.421/2022) – e inovações como o uso da eletrônica fortaleceram a R, tornando-a protagonista para a captação de crédito privado.
A R dispõe de vantagens perante títulos similares vinculados ao agronegócio, como a Cédula de Crédito Rural (CCR). A R pode ser liquidada física ou financeiramente e o crédito não precisa ser captado de instituição integrante do Sistema Nacional de Crédito Rural, como no caso da CCR.
Para além das modalidades – física, financeira ou verde –, a R traz consigo outras vantagens. A lei 14.421/2022 permitiu que o Fundo Garantidor Solidário (FGS) – em que participam, no mínimo, dois devedores e um credor -, possa ser utilizado em qualquer operação financeira vinculada à atividade empresarial rural, o que impacta diretamente as operações que utilizam a R.
Em um momento em que o agro tem cada vez mais se conectado com as questões ambientais, merece atenção especial a regulamentação do § 2 º, II, do artigo 1º da lei 8.929/1994 pelo decreto 10.828/2021, a qual dispõe sobre a emissão da Cédula de Produto Rural Verde (R-Verde) para os produtos rurais obtidos por meio de atividades vinculadas à conservação e recuperação de florestas nativas e seus biomas.
A R-Verde se caracteriza como verdadeiro instrumento de pagamento para serviços ambientais por meio do qual o produtor rural poderá ser remunerado por iniciativas sustentáveis. Desse modo, transformam-se a conservação e a recuperação ambiental em ativos, que ficam à disposição do produtor rural para obtenção de crédito junto ao mercado.
Outro benefício da R é a impenhorabilidade absoluta dos bens dados em garantia na R, conforme o art. 18 da lei 8.929/1994. O que inspira a impenhorabilidade absoluta é a função social da R, uma vez que há interesse público no robustecimento do financiamento privado à atividade agrícola. Esse interesse é proporcional à relevância do setor para a economia nacional.
A impenhorabilidade prevalece inclusive perante créditos trabalhistas. Essa tese foi defendida no Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Recurso Especial 1.327.643. No aspecto tributário, a R também apresenta vantagens. A regra geral aponta para a isenção de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e Imposto de Renda (IR).
Para os fundos de investimento, a R a a ser, cada vez mais, um ativo de interesse para composição de carteiras. A partir da lei 14.421/2022, podem compor a carteira do Fiagro títulos de securitização emitidos por pessoas físicas e jurídicas que integrem o agronegócio, o que abrange a R. A possibilidade de constituição de Fundo de Investimento em Direito Creditório (FIDC) ou até mesmo de estruturação de Fiagro Híbrido – cuja carteira absorve direitos creditórios, imóveis rurais e participações em empresas do setor – também surgem como opções para a R.
A lei 14.421/2022 atendeu também às demandas do setor quanto à prorrogação do prazo para registro da R, o qual ou a ser em até 30 dias da data da emissão ou do aditamento. O registro, em entidade autorizada pelo Banco Central, é condição de validade e eficácia da R.
Segundo a Resolução CMN 4.870/2020, a R emitida entre 1° de janeiro e 31 de dezembro de 2023 com valor de referência inferior a R$ 50 mil fica dispensada de registro. Contudo, essa dispensa não se aplicará para a R emitida em favor de instituição financeira e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central ou, para o caso de R negociada nos mercados de bolsa ou de balcão. A partir de 2024, portanto, todas as Rs deverão ser registradas em entidade autorizada pelo Banco Central.
Diante da breve exposição das principais vantagens da R, nota-se o porquê de tal instrumento ser o mais difundido para a captação de crédito para o agronegócio. Ela permite o financiamento de todos os elos da cadeia produtiva do agronegócio e, com a R-Verde, torna-se capaz de vincular a captação de recursos a padrões elevados de sustentabilidade. As recentes mudanças legislativas fortaleceram a R e, ao que tudo indica, seguirá fortalecida como protagonista na captação de crédito para o agronegócio nacional.
Por Ronnald Loureiro, advogado da área de Serviços Financeiros do Martinelli Advogados
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